quarta-feira, novembro 24, 2004
Histórias do CS
Mais um dia banal no CS. Consultas a tarde toda, que isto nem em dia de jogo do Porto abranda. O patati-patatá do costume: baixas e atestados, declarações para a piscina e para a carta de condução. Cúmulo: mulher de quarenta e poucos, bom estado geral; queixas de dores osteoarticulares. Que foi à junta médica e ficou mal - coitada, vai ter de trabalhar. Mas que não se sente bem. Precisa de um mês de baixa, porque não tem força para trabalhar. Ao mesmo tempo, pede declaração para a ginástica, para ir com as amigas a ver se emagrece!!! Que fazer???
Logo cedo, a melhora das "vagas". Queria consulta para a filha (que tem 28 anos). Que o Sr. Doutor já a tinha visto há um mês e tinha dado um antibiótico. Que se não passasse tinha que fazer "uns exames". Queria que lhe passasse os exames. Consulta do processo: a filha tinha lá ido há 1 mês, com uma escoriação purulenta do nariz. Levou 1 caixa de cipro e um anti-histamínico. Para voltar lá se não melhorasse. Agora não pode faltar ao emprego, mas quer fazer uns exames porque "aquilo voltou". E eu (a mãe) também tenho; eu não quero é ligar!!! - Já agora sr. Doutor, o meu marido não se sente bem e quer fazer uma "radioscopia ao estôgamo". Se lha posso passar. Que não gosta de vir a médicos. - As minhas tensões (da mãe) estão aqui (registos de 120/70). Digo-lhe que estão bem. - Mas sentia-me melhor com os outros, que tinha a tensão a 15/10. Que faça o que entender... Afinal a vida é sua e "um ohm tem de morrer"... A chamada consulta 3 em 1... Lá levou os exames para a filha (hemograma + IgE total), recusei-lhe o antibiótico que queria mais uma dose. O marido, que venha à consulta que os exames custam dinheiro ao estado...
A histérica já tinha ligado ontem. Queria consulta porque estava muito mal. Não queria ir ao hospital nem ao médico de urgência, porque não queria contar a história toda outra vez. O médico de família tinha que a ver. Ouvia-a a berrar do outro lado da sala, a 2 metros do telefone. Ontem não podia ser, que viesse hoje para as vagas. Chega atrasada, exige de novo consulta aos berros, afinal paga impostos (ou pagou em tempos, quando não estava pelo "fundo de desemprego" - que isto o estado é uma vergonha, o país está cada vez pior - nem lhe arranjam um emprego...). Não se tinha sentido bem. Doía-lhe muito a barriga, até se "borrou toda". Agora que já está melhor, mas tinha de contar ao Sôtor. Que o filho ia morrendo por causa de pessoas arrogantes como o Sôtor (que lhe tinha dito que não atendia porque já não tinha vagas, que se precisasse muito havia um colega de urgência) - que não lhe tinham diagnosticado uma apendicite. Foi ao SU, nem lhe fizeram uma análise. Deram um antibiótico e mandaram para casa. Continuou com febre e cada vez mais dores de barriga. 4 dias depois foi ao SU e foi de urgência para o HSJ. Tinha uma peritonite por abcesso apendicular. Cortou 10 cm de intestino. Diagnosticaram-lhe um Crohn. Que a culpa foi da médica que o viu a 1ª vez. - Se lhe fizesse uma análise descobria logo que ele tinha "apendecite". Agora já está melhor, mas quer um P1 para gastro e já agora, uma declaração para o filho (o da apendecite) poder tirar a carta... Mas era urgente e incomodou todos os utentes do CS...
Homem, 54 anos. Hipertenso de longa data. Trolha, etilismo crónico e tabagismo. Há 2 semanas aparece com análises: clearance da creatinina de 30. Repete exames. Desta vez tem 150. Ecografia renal obviamente normal. Tensões controlodas. Ri-se e confessa. -Sabe dôtor, da outra vez eu fiz mal. Bebi umas cervejas, mijei para fora, tornei a mijar para dentro, depois juntei água. Ri-se, satisfeito, agora que já f*d** uns contos ao estado. Quer uns medicamentos, para qualquer coisa. Deixar de beber e fumar é que não. Consulta daqui a um ano... -Ui doutor, ainda me dá 1 ano de vida? - E descansar, não preciso? Dava-me jeito um ano de baixa...
Dois casos tristes... 2 óbitos. Os primeiros desde que cheguei ao CS. Um de metastização disseminada de um carcinoma pulmonar oculto (sim, oculto - diagnóstico histológico da metástase cerebral - pulmão sem achados imagiológicos). O outro, uma velhinha. Noventa e seis anos. Demência vascular. Acordou morta... De que morre uma velhinha de 96 anos? De idade? Será que se pode pôr isso na certidão de óbito??? Estejam onde estiverem, que estejam em paz...
Logo cedo, a melhora das "vagas". Queria consulta para a filha (que tem 28 anos). Que o Sr. Doutor já a tinha visto há um mês e tinha dado um antibiótico. Que se não passasse tinha que fazer "uns exames". Queria que lhe passasse os exames. Consulta do processo: a filha tinha lá ido há 1 mês, com uma escoriação purulenta do nariz. Levou 1 caixa de cipro e um anti-histamínico. Para voltar lá se não melhorasse. Agora não pode faltar ao emprego, mas quer fazer uns exames porque "aquilo voltou". E eu (a mãe) também tenho; eu não quero é ligar!!! - Já agora sr. Doutor, o meu marido não se sente bem e quer fazer uma "radioscopia ao estôgamo". Se lha posso passar. Que não gosta de vir a médicos. - As minhas tensões (da mãe) estão aqui (registos de 120/70). Digo-lhe que estão bem. - Mas sentia-me melhor com os outros, que tinha a tensão a 15/10. Que faça o que entender... Afinal a vida é sua e "um ohm tem de morrer"... A chamada consulta 3 em 1... Lá levou os exames para a filha (hemograma + IgE total), recusei-lhe o antibiótico que queria mais uma dose. O marido, que venha à consulta que os exames custam dinheiro ao estado...
A histérica já tinha ligado ontem. Queria consulta porque estava muito mal. Não queria ir ao hospital nem ao médico de urgência, porque não queria contar a história toda outra vez. O médico de família tinha que a ver. Ouvia-a a berrar do outro lado da sala, a 2 metros do telefone. Ontem não podia ser, que viesse hoje para as vagas. Chega atrasada, exige de novo consulta aos berros, afinal paga impostos (ou pagou em tempos, quando não estava pelo "fundo de desemprego" - que isto o estado é uma vergonha, o país está cada vez pior - nem lhe arranjam um emprego...). Não se tinha sentido bem. Doía-lhe muito a barriga, até se "borrou toda". Agora que já está melhor, mas tinha de contar ao Sôtor. Que o filho ia morrendo por causa de pessoas arrogantes como o Sôtor (que lhe tinha dito que não atendia porque já não tinha vagas, que se precisasse muito havia um colega de urgência) - que não lhe tinham diagnosticado uma apendicite. Foi ao SU, nem lhe fizeram uma análise. Deram um antibiótico e mandaram para casa. Continuou com febre e cada vez mais dores de barriga. 4 dias depois foi ao SU e foi de urgência para o HSJ. Tinha uma peritonite por abcesso apendicular. Cortou 10 cm de intestino. Diagnosticaram-lhe um Crohn. Que a culpa foi da médica que o viu a 1ª vez. - Se lhe fizesse uma análise descobria logo que ele tinha "apendecite". Agora já está melhor, mas quer um P1 para gastro e já agora, uma declaração para o filho (o da apendecite) poder tirar a carta... Mas era urgente e incomodou todos os utentes do CS...
Homem, 54 anos. Hipertenso de longa data. Trolha, etilismo crónico e tabagismo. Há 2 semanas aparece com análises: clearance da creatinina de 30. Repete exames. Desta vez tem 150. Ecografia renal obviamente normal. Tensões controlodas. Ri-se e confessa. -Sabe dôtor, da outra vez eu fiz mal. Bebi umas cervejas, mijei para fora, tornei a mijar para dentro, depois juntei água. Ri-se, satisfeito, agora que já f*d** uns contos ao estado. Quer uns medicamentos, para qualquer coisa. Deixar de beber e fumar é que não. Consulta daqui a um ano... -Ui doutor, ainda me dá 1 ano de vida? - E descansar, não preciso? Dava-me jeito um ano de baixa...
Dois casos tristes... 2 óbitos. Os primeiros desde que cheguei ao CS. Um de metastização disseminada de um carcinoma pulmonar oculto (sim, oculto - diagnóstico histológico da metástase cerebral - pulmão sem achados imagiológicos). O outro, uma velhinha. Noventa e seis anos. Demência vascular. Acordou morta... De que morre uma velhinha de 96 anos? De idade? Será que se pode pôr isso na certidão de óbito??? Estejam onde estiverem, que estejam em paz...