quarta-feira, fevereiro 09, 2005

Contacto com o lar

Foi no início de Junho de 2003, que me propus a ir com outro colega para uma cidade do Alto Douro, realizar o estágio de Medicina Comunitária.
Durante 2 semanas, estabelecemo-nos numa pequena comunidade, onde ao fim do 1º dia éramos já conhecidos como "os novos doutores". Entre as muitas peripécias ocorridas (talvez fiquem para outra história), tivemos a oportunidade de contactar de perto com a realidade da população local, quer através da frequência do Centro de Saúde, quer através de visitas domiciliárias e inclusivamente através de visitas ao Lar de Idosos local.

Confesso que a minha experiência de Lares era (e continua a ser) muito reduzida. As poucas visitas que tinha feito, foram a umas "tias" velhotas que habitavam à altura um daqueles "lares 5 estrelas". O primeiro contacto com o lar, até não foi mau... Fomos apresentados ao Director, numa recepção simples mas agradável. Após 5 minutos de conversa, começamos então a visita propriamente dita. Dirigimo-nos com as enfermeiras que nos acompanhavam à "sala de convívio" e tivemos o 1º grande choque. Uma televisão num canto; cadeiras a toda a volta, com idosos sentados, de olhar absorto, sem qualquer tipo de comunicação com o meio exterior. Tentámos ainda "arrancar" uns sorrisos - o que não foi tarefa fácil - e demos a assistência técnica a quem "estava marcado". Entre uns pensos e uns conselhos gerais, ficou despachado o assunto.

Entretanto, fomos para outra ala do lar, onde estavam os "quartos". A caminho, passamos por uma varanda onde alguns dos idosos em melhor estado conversavam animadamente e por onde demorámos uns bons 10 minutos a passar, quais políticos em campanha a entregar beijinhos e frases feitas!

Chegámos então à ala dos quartos, onde a primeira impressão que retive foi o cheiro. Um misto de cheiro a urina com suor, misturado com o cheiro a "doença" e a medicamentos. Uma combinação explosiva! Os quartos, inicialmente planeados para 1 a 2 idosos, continham entre 4 e 5 camas. Tudo gente do mesmo sexo em cada ala, para não haver confusões, excepto o caso dos casais, que partilhavam o quarto com mais 2 ou 3 pessoas. Dentro das condições existentes, tentaram dar-lhes alguma dignidade, com quarto de banho privativo (para cada quarto) e 1 armário (pequeno) para cada pessoa. Fomos assistir algumas das pessoas que estavam acamadas (essencialmente tratamentos de úlceras de pressão), e percebemos que durante todo o dia, tirando os períodos das refeições, foramos a sua única companhia.

Era contudo louvável, o esforço que os profissionais deste lar faziam, para melhorar a vida destas pessoas e manter um ar "higiénico" nas instalações planeadas para 1/3 da lotação actual.

Terminamos a visita com um apertozinho no estômago, em parte devido às condições que estes "velhotes" tinham, ao seu ar de sofrimento e à falta de privacidade, mas acima de tudo pela solidão que demonstravam. Deve ser terrível, viver os últimos anos da vida, a ver os "vizinhos" morrer e permanecer sozinho na multidão...

Comentários:

tencionava comentar a Campanha Surreal. Talvez por ser tal não o consegui (e net também é surreal!). vou referir este post la no meu, tá colega? porque o achei real, real, real....não confundir com monarca  
Enviar um comentário

«Inicial